Homenagem a Panait Istrati

No dia 14 de Maio de 2009, às 18h30, ICR Lisboa presta uma homenagem ao escritor romeno Panait Istrati. O evento começa com a inauguração de uma exposição dedicada à obra deste escritor, na Sala de Exposições do ICRL (R. Dr. António Cândido, 18, Lisboa). «Ramos silvestres para Panaït Istrati/ Crengi silvestre pentru Panaït Istrati apresenta-se num duplo registo de desenho, sendo que os 35 desenhos registam múltiplos vestígios do mundo vegetal assimilados como materiais que induzem técnicas e processos. Como se a natureza selvagem do Baragan tivesse encontrado um meio de se imprimir à procura da sua própria materialidade.» (António Ferreira) Logo depois da inauguração, La Nouvelle Librairie Française (localizada nas mesmas instalações do ICR Lisboa) acolherá uma comunicação do Prof. Fernando Couto e Santos acerca da obra de Panaït Istrati. Por esta ocasião, a livraria, associada a este evento, terá em primeiro plano, à venda, livros do escritor romeno de língua francesa e a Biblioteca do Instituto Franco-Português dedica-lhe uma mini-exposição.

RAMOS SILVESTRES PARA PANAIT ISTRATI
O meu primeiro encontro com Panait Istrati foi casual: comprei um livro-miniatura Os Cardos de Bărăgan, numa Feira da Ladra e li-o dum fôlego, num jardim anexo, à beira-mar plantado. Dissipadas as emoções duma narrativa de desagregação das raízes familiares, restava o absoluto da Natureza. À instabilidade do edifício social Panait Istrati contrapõe sinais visíveis da ciclicidade do tempo que nos envolve e nos tranquiliza.
«E lá estavam os cardos, a meus pés, belos como grandes ramos de buxo, numerosos como estrelas, carnudos, a rebentar de seiva, mas imóveis.»
As personagens deste livro dramatizam a incerteza do amanhã e interrogam-se, tomando os cardos como testemunhas e pretexto: «Daí a um mês, andaria eu a correr como eles? Viria eu a saber para onde é que eles iam e onde nos levam?»
Esta linha (des)contínua de interrogações reduz o homem a uma escala risível, de joguete de forças que o transcendem e de presença física perdida numa Natureza em contínua mutação, desdobrando-se em imagens poderosas. É aqui que o olhar de Panait Istrati se afina num registo pictórico que persiste, agigantando-se sobre as paixões humanas. É como se Panait Istrati encontrasse nos cardos o pretexto de sublimação estética da fragilidade humana que tanto singulariza este livro, afinal a sua obra.
E é aqui que se abre o meu caderno de desenhos de flores silvestres, procurando uma homologia estrutural entre o gesto do escritor romeno e o meu próprio. O gesto de alguém perdido no tempo que desenha ao invés das solicitações normativas da contemporaneidade, usando matérias orgânicas e suportes banais, convencido que as imagens criadas são apenas afloramentos «de sonho e audácia», num registo quase diarístico, celebrando a alegria de estar vivo.
«E os cardos? Esses continuam a sua história».

António Ferreira

PANAIT ISTRATI, O VAGABUNDO COSMOPOLITA
Fernando Couto e Santos nasceu em Lisboa a 11 de Dezembro de 1965. Lecciona Português e Francês no ensino secundário e trabalha igualmente na área da formação profissional.
Nos últimos tempos tem apresentado livros, tem proferido algumas palestras e escrito crónicas sobre literatura para diferentes sítios na Internet, nomeadamente o da Nouvelle Librairie Française de Lisboa e também para o boletim Literalia da Mediateca do Institut Franco-Portugais. Tem igualmente um blogue sobre livros em francês intitulado La Plume Dissidente.
Tem colaborado regularmente com o Instituto Cultural Romeno, apresentando o livro Haverá vida antes da morte? do poeta Dinu Flamand e intervindo no Colóquio Internacional sobre a obra do poeta, dramaturgo, filósofo e diplomata Lucian Blaga.

Panaït Istrati, as razões de uma escolha.

Foi já nos anos noventa da pretérita centúria que descobri com enorme entusiasmo a obra do escritor romeno Panaït Istrati. A riqueza e a diversidade das suas histórias, esmaltadas pelo colorido das paisagens descritas e das personagens retratadas, tornam únicas as ficções deste escritor autodidacta que desde cedo revelou uma rara intuição poética, pois se a sua obra é essencialmente constituída por contos e romances, o poder mágico das suas palavras confere aos seus livros uma indiscutível dimensão poética.
Da sua errância pela Europa e pelo Mediterrâneo, aliada à sua vivência das múltiplas realidades da infância e adolescência no porto de Braila, Panaït Istrati soube extrair uma filosofia de vida que fazia da amizade e de um ideal de justiça e de fraternidade as razões da sua existência e da sua formação como homem.
As suas preocupações sociais e o seu apurado sentido cívico levaram-no não raro a tomar posição pelos humildes e pelos que não tinham voz. A sua indignação perante aqueles que em nome dos mais nobres ideais foram actores ou cúmplices de crimes e se enredaram numa sinistra teia burocrática levou a que fosse durante anos execrado e ignorado. No entanto, nos últimos tempos foi-lhe feita justiça e muitos reconhecem hoje não só a excelência da sua obra literária, mas também o seu papel precursor – através do seu livro Vers l´autre flamme – na denúncia do regime soviético conduzido por Josef Staline.
Importa pois dar a conhecer a obra e o exemplo cívico de Panaït Istrati a todos aqueles – que são ainda muito numerosos – que desconhecem este admirável escritor romeno.


Fernando Couto e Santos