no âmbito da 2ª temporada musical do ICRL / JaFo Trio no Hot Clube de Portugal

Como primeira colaboração com o Hot Club de Portugal, um dos clubes de jazz mais importantes de Portugal, o Instituto Cultural Romeno de Lisboa apresenta um concerto extraordinário de jazz com o trio JaFo, iniciado por Decebal Bădilă. Músico inato, com uma sólida reputação internacional, maestro da guitarra baixo e do contrabaixo, solista e sideman, arranjista e professor, Bădilă teve a sua estreia lusitana no âmbito do Primeiro Outono Musical Romeno de Portugal, organizado pelo ICR Lisboa em 2008. O seu projecto do ano passado deleitou o público com um programa de uma expressividade notável, no qual, a maioria das peças eram interpretadas com um forte cunho de uma "sensibilidade jazzística romena com sotaque brasileiro".

Desta vez, o novo grupo criado por Bădilă conta com um elemento quase - inédito: o cimbalom toma o lugar do piano e torna-se protagonista. Considera-se que a primeira representação do antigo instrumento de cordas percutido com batutas aparece num baixo-relevo assírio encontrado em Kyindjuk (datado do ano 3500 A. C., cf. Wikipedia). O que é certo é que ao longo dos tempos o instrumento passou da zona iraniana (em Persa chama-se santour) para diversas culturas musicais euro-asiáticas. Algumas denominações: santir (Arménia); tsintsila (Géorgia); sandouri (Grécia); tsimbali (Rússia, Ucrânia, Bielorússia); cimbalom (Hungria); cimbole (Letónia); cimbal (Tchéquia, Eslováquia); Zymbal/Hackbrett (Alemanha, Áustria, Suiça); tam-thap-luk (Vietname); cimbalom/hammered dulcimer (Inglaterra). Nas zonas do Centro-Leste da Europa, o cimbalom impôs-se como elemento base da instrumentação folclórica. É possível afirmar que a sua própria sonoridade específica realiza uma certa mediação entre os universos melódicos antes disjuntos da Ásia e Europa, que condensa numa expressão comum. Através do cimbalom, o modalismo flexível com o qual nos habituaram os intérpretes da música tradicional do velho continente (de onde se inspiraram tantos compositores eruditas) encontra-se e concilia-se, na mesma caixa de ressonância, com o hieratismo ascético de factura pentatônica.

A intuição de Decebal Bădilă funcionou perfeitamente na selecção dos membros do trio JaFo: o público internacional poderá descobrir as valências jazzísticas do cimbalom, graças ao vulcânico talento do jovem Marius Preda. Ele excela justamente no controlo do fraseamento e no delineamento das formas, tão visíveis como os brilhos sedutores da sua espontaneidade de improvisação. Além disso, tal como o Decebal Bădilă, Preda demonstra uma inesgotável capacidade de "remodelar", através da sua sensibilidade, diversas fontes de inspiração do mapa-mundo musical. A interacção entre os dois músicos confere uma maleabilidade totalmente especial a um instrumento milenário, readaptado às exigências versáteis da música do século 21. Poderíamos dizer que Marius Preda consegue a performance de fazer do cimbalom um instrumento tão jazzístico como o vibrafone. Aliás, além do cimbalom, violino e acordeão, ele domina com a mesma destreza o instrumento no qual exceleu Lionel Hampton.

O trio é completado pela contribuição do notável percussionista Antal Steixner. Ele utiliza, com discrição e eficiência, um arsenal de instrumentos de percussão, centrados à volta do cajon peruano, entre os quais mencionamos o udu (instrumento africano que tem a forma de um vaso e o timbre próximo da tabla indiana); djembé (tambor africano); darbouka (tamborim portátil norte-africano) e uma multidão de pratos. No seu país de residência, Holanda, Steixner é um respeitável percussionista de flamenco. Sua natureza jovial revela-se parcimoniosamente nos fundos sonoros do JaFo Trio, destinados antes a suster os esforços solísticos dos seus colegas, do que exibir o seu potencial individual.

A despeito da fórmula de agregação de certo modo minimalista, Trio JaFo conquista pela coerência do acto criativo, pela interacção exuberante entre os três músicos, pela abordagem inédita de um repertório com múltiplas raízes: standards de jazz, temas originais da Roménia, América Latina, tradições musicais ibéricas, árabes etc. Uma feliz situação de conciliação dos standards estéticos – exigentes, mas nada enquistados – com uma forte capacidade de comunicação.